EM BUSCA DE UMA ALTERNATIVA EFICAZ
Atualmente, a resolução de conflitos e de problemas complexos é uma competência bastante requisitada não só no mundo do trabalho, em função da velocidade das mudanças e da distância física entre funcionários, mas também nos ambientes escolar, familiar e comunitário. Nesses casos, muitas vozes são chamadas a protagonizar.
A história da humanidade é marcada pela crença de que ações punitivas corrigem o comportamento. Porém, a insatisfação da sociedade com a ineficiência da forma como fazemos justiça, com índices alarmantes de violência e criminalidade, unidas às revelações mais recentes da neurociência, vem abrindo espaço para refletir e disseminar formas mais eficazes de resolver conflitos, na raiz de suas causas.
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Pesquisas recentes mostram que os números de prisões crescem no Brasil, bem como os índices de violência.
Em um período de 26 anos, a população carcerária do Brasil multiplicou oito vezes e chegou a 726.712 pessoas presas, que equivale ao dobro do número de vagas do país.
O Brasil também teve, em 2016, o maior número de mortes violentas do mundo. Foram 70,2 mil, representando mais de 12% dos registros em todo o planeta.
Fazendo uma reflexão sobre os dados apresentados, os Círculos de Construção da Paz e os Círculos Restaurativos vêm sendo estudados e implementados em todo o mundo no âmbito da justiça, escolar e familiar.
Ouça o podcast a seguir para conhecer mais sobre a história das práticas restaurativas.
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Acesse a notícia relacionada às práticas restaurativas: https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/11/1555228-em-15-estados-justica-inova-com-pratica-restaurativa.shtml.
UMA NOVA FORMA DE RESOLVER CONFLITOS
Trabalhar a resolução de conflitos, na perspectiva da Justiça Restaurativa, significa incluir todos para participarem como sujeitos de direito, que podem e devem expressar suas opiniões nos temas que lhes afetam e, portanto, se responsabilizarem por acordos que restaurem as relações rompidas. É sair de uma lógica linear e autoritária para abraçar a complexidade das relações de causa e efeito por meio da corresponsabilização e da colaboração. Observe a figura a seguir:
O esquema visual apresenta formas para sair da lógica linear. No primeiro momento fala sobre a força unilateral e autoridade de coerção estatal, vertical, impositiva e violenta, com foco na culpabilização. Já a força multilateral e democrática da coesão social, com foco na responsabilização.
O justo é uma construção comunitária e subjetiva. Os compromissos assumidos em um processo restaurativo são mais autênticos do que a simples concordância em cumprir objetivos traçados pelo juiz em uma sentença.
O infográfico mostra a diferença entre justiça tradicional ou retributiva e Justiça restaurativa. justiça retributiva é: O crime é uma violação da lei e do Estado (uma abstração). Justiça restaurativa: O crime é uma violação de pessoas, vínculos e relacionamentos. justiça retributiva é: As violações geram culpa. Justiça restaurativa: As violações geram obrigações. Justiça retributiva: Necessidades e direitos das vítimas ignorados. justiça restaurativa é: Necessidade e direitos das vítimas são centrais. Justiça retributiva: Feridas do ofensor periféricas. justiça restaurativa é: Feridas do ofensor são importantes. Justiça retributiva: A justiça exige que o Estado determine a culpa e imponha uma punição. Justiça restaurativa: A justiça envolve vítimas, ofensores e membros da comunidade num esforço comum para corrigir a situação. Justiça retributiva: Foco central: os ofensores devem receber o que merecem. Justiça restaurativa: Foco central: as necessidades da vítima e a responsabilidade do ofensor de reparar o dano cometido. Justiça retributiva: Ofensa definida em termos técnico-jurídicos. Justiça restaurativa: Ofensa entendida no contexto moral, social, econômico e político. Justiça retributiva: Que leis foram infringidas? Justiça restaurativa: Quem sofreu danos? Justiça retributiva: Quem fez isso? Justiça restaurativa: Quais são suas necessidades? Justiça retributiva: O que o ofensor merece? Justiça restaurativa: De quem é a obrigação de suprir essas necessidades? Justiça retributiva: Foco no passado. Justiça restaurativa: Foco no futuro. Justiça retributiva: Isolamento, fragmentação, linearidade. Justiça restaurativa: Foco no futuro. Visão integral e múltipla da complexidade.
A abordagem restaurativa está fortemente ancorada nos seguintes objetivos:
O processo tem como princípio a democracia ativa, a partir da igualdade de direitos e deveres dos participantes, sempre com dignidade, respeito, colaboração, diálogo e empatia na busca por soluções para os conflitos nas raízes das suas causas, evitando que a situação ocorra novamente.
Essas soluções só são possíveis de serem criadas a partir da compreensão dos fatos e dos danos causados. Por isso, os círculos consistem em posicionar frente a frente todos os envolvidos em um conflito, afetados direta ou indiretamente.
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Assista, também, ao programa exibido na TV Justiça em 24 de fevereiro de 2014 sobre o início do trabalho da Justiça Restaurativa no Brasil:
ACOLHENDO A DOR PARA QUEBRAR CICLOS DE VIOLÊNCIA
Mas como os círculos restaurativos podem ser utilizados para combater os ciclos de violência? Ouça no podcast a seguir.
Baixe a transcrição do podcast a seguir, para saber como os círculos restaurativos podem ser utilizados para combater os ciclos de violência. Baixar transcrição.
Olga Botcharova é uma russa especialista em resolução de conflitos que viaja o mundo mediando seminários sobre a dinâmica de diálogo entre vítima-agressor-comunidade e princípios de pacificação. Participou como mediadora de acordos fundamentais durante a dissolução da antiga Iugoslávia.
A ilustração a seguir, elaborada por Olga, mostra os sete passos para a reconciliação e a quebra dos ciclos de violência:
O infográfico mostra um círculo central pontilhado e um círculo maior ao redor. O círculo central fala sobre agressão o Ato de agressão (justificado), Dor, Ofensa, Choque, Criar a história “certa”, Consciência da perda/pânico, Desejo de justiça/vingança, Repressão da dor/medo, Ira “Por que eu?”. O próximo circulo fala sobre reconciliação: Justiça justa para todos, Fazer acordos, Admitir a culpa Pedir desculpas, Escolher perdoar, Seguir adiante com a vida, Re-humanizar o inimigo “Por que eles?”, Aceitar a perda Lidar com o medo, Expressão da dor/luto.
O que faz o ciclo da agressão ser quebrado é a expressão dos danos e das emoções em um ambiente de confiança, empatia e compreensão.
RECONHECENDO, RESPONSABILIZANDO-SE, RESTAURANDO E REINTEGRANDO
Muitas vezes as pessoas estão pouco propensas a assumir responsabilidade por seu comportamento. Quando isso acontece, a punição pode ser necessária para restringir a possibilidade de praticar um mal maior e conter a violência. Nessas situações, pode haver um papel justificável para algumas formas de punição, dentro de uma abordagem que a considere como remédio transitório até que se possa ter abertura para o diálogo e as próximas etapas do processo.
O Círculo Restaurativo somente acontece se todos os envolvidos concordarem em participar. Por isso, o pré-requisito é a voluntariedade. E em especial, aqueles que causaram danos, precisam reconhecer e se responsabilizar pelo que fizeram. Essas condições viabilizam as demais etapas do processo: restaurar e reintegrar.
CÍRCULOS RESTAURATIVOS
O modelo de círculos restaurativos é considerado um modelo “universal” para resolução de conflitos. Permite variações de técnicas, roteiros e contextos, sem ficar restrito a casos ligados ao sistema judiciário. Dele participam vítima, ofensor, familiares e membros da comunidade.
O infográfico mostra o círculo restaurativo. No pré-círculo temos Facilitador convida os possíveis participantes e explica o propósito do encontro e a natureza do processo. O círculo é a reunião dos envolvidos no conflito. O objetivo é abordar o problema e construir soluções para o futuro, apresentação/Check-in mesmo que já se conheçam, os envolvidos se apresentam. Também podem falar sobre como foi a chegada ao encontro. Valores Os participantes falam sobre os valores importantes para sua vida e para uma boa conversa. Diretrizes São estabelecidas diretrizes para o encontro, como duração e comportamento adequado, entre outros pontos. Contação de história Momento para compartilhar histórias de vida – o que gera conexão e empatia entre quem está no círculo. Abordagem do conflito O conflito vem à tona. Hora de cada um falar o que sente em relação ao ocorrido, impacto, preocupações etc. Construção de consenso O que é preciso para todos seguirem em frente? O que o ofensor pode oferecer para reparar o dano? Um plano é elaborado em conjunto. Encerramento Como foi o círculo para os participantes? O facilitador encerra o encontro. No pós-círculo em um encontro posterior é feito para acompanhar e checar se o acordo está sendo cumprido.
Como observamos, a metodologia é composta por três fases: o pré-círculo, o círculo e o pós-círculo. O Pré-círculo é aquele em que o facilitador fará as perguntas restaurativas individualmente para as pessoas mais diretamente envolvidas com o conflito:
Ao ouvir as respostas para a pergunta sobre quem mais foi afetado, o facilitador também mapeia aquelas pessoas que estão envolvidas indiretamente, mas que foram impactadas e podem contribuir com o Círculo. As seguintes etapas dão sequência à metodologia:
Ao ouvir os fatos, o facilitador também identifica os representantes das redes de apoio (assistência social, saúde, educação, etc.) que precisam participar.
Conversa com todos individualmente, fazendo as perguntas restaurativas e explicando os princípios e objetivos do Círculo, pedindo que já comecem a pensar que ações poderão sugerir para o acordo.
O Círculo não deve ser um espaço para expressar raiva, vingança ou acusações. As pessoas precisam estar preparadas para trabalhar as soluções e o futuro, de modo que o problema não volte a ocorrer.
O facilitador deve fazer quantos pré-círculos forem necessários até chegar a este estágio.
O Círculo é o momento em que as perguntas restaurativas são feitas em público, em um espaço de confiança e sigilo.
O facilitador deve mediar o equilíbrio de poder entre as partes, mantendo os princípios da metodologia e estimulando que as soluções sejam cocriadas pelos envolvidos, a partir do diálogo e da compreensão mútua.
Ao iniciar a produção de um plano de ação, é importante atentar para que sejam proporcionais ao dano e relacionadas a ele, criando experiências de aprendizagem para todos. Este deve considerar as seguintes necessidades:
Após o consenso sobre as ações do plano, os envolvidos combinam os prazos e reuniões de acompanhamento, os pós-círculos.
A mudança de paradigma que propõe a facilitação dos círculos está baseada na colaboração, na construção de consenso, no respeito à diversidade como forma de representação das múltiplas vozes sociais.

A imagem representa pontos de vista de um mesmo objeto. O objeto apresentado é um cilindro formado por duas bases circulares paralelas e uma reta com extremidades em cada uma das bases. O cilindro aparece em um quarto a sombra projeta em uma parede o formato circular e está escrito: isso é verdadeiro. Em outra parede a forma de um quadrado e está escrito: isso é verdadeiro. No cilindro está escrito: Essa é a verdade.
FACILITANDO CÍRCULOS RESTAURATIVOS
Agora que você já conhece os benefícios da realização dos círculos restaurativos, veja o vídeo sobre como esse processo pode ser facilitado:
Se o facilitador estiver emocionalmente envolvido com determinada situação ele poderá ter uma reação condizente com a punição, atitude que o colocará em contradição metodológica e filosófica com preceitos restaurativos.
FORMANDO REDES DE APOIO NO SENAC SÃO PAULO
A partir da necessidade de relacionamento com organizações parceiras que possam oferecer serviços complementares públicos e de baixo custo aos alunos e funcionários, as unidades foram convidadas a construir um Catálogo de Orientações Psicossociais : psicoterapia, assistência jurídica, proteção contra a violência, tratamento para dependência química, etc.
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Para conhecer o Catálogo de Orientações Psicossociais, acesse: http://www.intranet.sp.senac.br/intranet-frontend/noticias/detalhes/56517
O objetivo é criar e manter um banco centralizado de contatos de parceiros que possa servir de consulta e orientação para o encaminhamento. Com isso, espera-se desenvolver uma cultura de corresponsabilidade nos funcionários para acolhimento e orientação, sempre que demandados ou observada a necessidade, formando uma rede interna de amparo, de maneira descentralizada.
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Guia de Práticas Circulares: http://www.intranet.sp.senac.br/intranet-frontend/uploads/download/arquivo/314152
Mediação de conflitos e abordagens restaurativas: construindo relacionamentos saudáveis nas comunidades escolares: http://www.intranet.sp.senac.br/intranet-frontend/uploads/download/arquivo/315202
Atividade 5 - VAMOS PRATICAR?
Agora que você está familiarizado com as práticas restaurativas na resolução de problemas, analise os conflitos a seguir e selecione as soluções correspondentes. Após concluir a classificação, clique em enviar.
Digite os números correspondentes nos campos em branco:
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Fonte: Paul McCold e Ted Wachtel, Instituto Internacional de Práticas Restaurativas, Bethlehem, Pensilvânia, EUA
Referências
GRECCO, Aimée e outros vários autores. Justiça Restaurativa em Ação - Práticas e Reflexões. Editora Dash, 2014.
LEDERACH, John Paul. Transformando Conflitos. Palas Athena: 2012.
MULLET, Judy H.; AMSTUTZ, Lorraine S. Disciplina Restaurativa para Escolas. São Paulo: Palas Athena, 2012.
MUSZKAT, Malvina Ester. Guia Prático de Mediação de Conflitos: Em Famílias e Organizações. Editora Summus: 2005.
PRANIS, Kay. Processos Circulares de construção de paz. Palas Athena: 2010.
WACHTEL, Ted; WACHTEL, Ben; O’CONNELL, Terry. Manual de práticas restaurativas para docentes, agentes disciplinadores e administradores de instituição de ensino. Bethlehem, Pensilvânia: International Institute Restorative Practices, 2012.
ZEHR, Howard. Trocando as lentes – um novo foco sobre o crime e a justiça / justiça restaurativa. São Paulo: Palas Athena, 2008.