Logotipo do Senac

Conceitos

O CONCEITO DE RAÇA

A palavra “raça” vem do italiano razza, que por sua vez tem origem em ratio, palavra latina que significa “categoria”, “espécie”. Em 1684, o médico francês François Bernier construiu uma classificação da diversidade humana dividindo os homens por diferentes “raças”, de acordo com suas características físicas.

Essa hipótese biológica sobre as divisões humanas não tem validade científica, mas consolidou, no período da colonização europeia, a ideia da existência de uma hierarquia racial: o povo branco europeu teria superioridade cultural, econômica, ética e moral em relação aos demais povos.

A hierarquia racial foi usada para justificar a escravidão, a colonização e a exploração de diversos grupos e territórios do mundo. Era encarada não como uma questão social, mas sim como uma questão biológica: o homem branco europeu dominaria a cultura e a economia por ser biologicamente mais racional e inteligente, o indígena seria colonizado por sua selvageria natural, enquanto o negro teria menos tendência biológica para o trabalho intelectual e, por isso, deveria ser usado em trabalhos braçais, longe da política e da construção do mundo.

Mas se esse conceito é uma invenção, por que continuar falando de “raça negra”? Não seria mais respeitoso e preciso utilizar o termo “etnia negra”?

ET.NI.A (do grego ethnos, povo + -ia)

substantivo feminino

Agrupamento de famílias numa área geográfica cuja unidade assenta sobre uma estrutura familiar, econômica e social comum e sobre uma cultura comum.

(PRIBERAM, 2019)

A população negra mundial não tem a mesma cultura, língua ou religião. Do mesmo modo, a população negra mundial não divide a mesma área geográfica ou a mesma estrutura social e econômica. Sendo assim, não é possível afirmar que a população negra é uma etnia – negros são parte de várias etnias diferentes ao redor do mundo, não existe uma “etnia negra”.

Manter o termo “raça” nos tempos atuais é entender que não estamos falando sobre uma verdade biológica científica, mas sobre um povo atingido por essas divisões criadas no passado.

A “raça negra” é o conjunto de indivíduos que sofre os impactos de uma inferiorização criada no passado.

Saiba mais

Para compreender melhor os conceitos apresentados, clique aqui e leia o artigo Uma abordagem conceitual das noções de raça, racismo, identidade e etnia, do Prof. Dr. Kabengele Munanga (USP).

Preconceito x Discriminação x Racismo

Em nosso cotidiano, é muito comum relacionar o racismo ao preconceito contra grupos diferentes em geral. Nesse sentido, o racismo não seria uma particularidade das pessoas negras no Brasil – brancos, orientais e outros grupos também estariam sujeitos aos males do racismo. Mas será que isso realmente faz sentido?

RA.CIS.MO (raça + -ismo)

substantivo masculino

  1. Preconceito e discriminação direcionados a quem possui uma raça ou etnia diferente; geralmente se refere à segregação racial.
  2. [Por Extensão] Comportamento hostil dirigido às pessoas ou aos grupos sociais que pertencem a outras raças e/ou etnias.
  3. Reunião dos conceitos que afirmam existir uma hierarquia entre etnias e/ou raças.
  4. Sistema doutrinário ou político que estabelece a exaltação de uma raça, em detrimento das demais; sistema que afirma a superioridade de um grupo racial relativamente aos outros, preconizando, em particular, o isolamento destes no interior de um país (segregação racial) ou até visando o extermínio de uma minoria: o racismo antissemita dos nazistas.

(DICIO, 2019)

Para compreender o que é racismo, é necessário compreender antes as diferenças entre preconceito, discriminação e racismo.

MI.NO.RI.A

substantivo feminino

  1. Inferioridade em termos numéricos.
  2. A parte constituída de menos representantes numa assembleia ou qualquer outro conselho, que discorda da parte mais numerosa.
  3. [Antropologia, Sociologia] Subgrupo de uma sociedade que se considera ou é considerado diferente do grupo dominante, em face das características religiosas, étnicas, políticas, de nacionalidade, língua etc. e, em decorrência dessas diferenças, não tem a mesma participação na sociedade como um todo, nem as mesmas oportunidades, sofrendo, muitas vezes, discriminação e preconceito.

(MICHAELIS, 2020)

Embora preconceito, discriminação e racismo estejam relacionados, não são a mesma coisa. Observe a tabela a seguir e perceba as diferenças entre esses conceitos.

A tabela compara preconceito, racimo e discriminação.

Preconceito

Significado: o preconceito é uma opinião formada de modo superficial em relação a determinada pessoa ou grupo, que não é baseada em uma experiência real ou na razão.

Motivo: baseado na ignorância ou em estereótipos.

Resultado: pode ter impactos psicológicos na vida dos indivíduos, causando processos de sofrimento psíquico, como no caso de bullying.

Manifesta-se como crença e não consciente.

Exemplos:

  • achar que alguém com obesidade não emagrece apenas porque é preguiçoso;
  • acreditar que loiras são burras;
  • criar apelidos para pessoas, baseando-se em suas características e tirando sua individualidade – “careca”, “branquelo”, “palmito”, “salsicha” etc.

Discriminação

Significado: a discriminação refere-se a ações que têm impacto negativo na vida material de uma pessoa ou grupo, motivadas pelo seu pertencimento a certo grupo (como etnia, sexualidade ou gênero). É o preconceito ou racismo em forma de ação.

Motivo: Parte da estigmatização de minorias políticas – grupos altamente estigmatizados e que possuem baixo poder político e econômico: mulheres (devido ao machismo e à misoginia), LGBTs (devido à homofobia), negros (devido ao racismo), população pobre, entre outros.

Resultado: conduz à rejeição e à exclusão de certo grupo de pessoas, o que impede que haja avanços na vida econômica e material.

Manifesta-se como ação. Pode ser consciente e não consciente.

Exemplos:

  • não contratar um homossexual por acreditar que ele pode impactar negativamente seu negócio;
  • deixar de oferecer uma oportunidade para uma pessoa negra por presumir que ela não terá capacidade intelectual de cumprir a tarefa;
  • impedir a entrada de uma pessoa pobre e malvestida num estabelecimento;
  • pagar salários menores às mulheres por acreditar que elas irão se dedicar mais ao lar e aos filhos do que ao trabalho.

Racismo

Significado: o racismo é um sistema que cria uma hierarquia na qual determinado grupo racial possui superioridade moral, cultural, econômica e política diante dos demais. Está na estrutura da sociedade e dialoga com sua construção política e histórica.

Motivo: é resultado da hierarquia racial presente na construção de uma sociedade e das relações estabelecidas entre os grupos dessa região.

Resultado: Promove a inferiorização de um grupo em relação a outro em vários níveis do cotidiano, autorizando a estigmatização severa, que pode, inclusive, levar à morte dos que fazem parte do grupo inferiorizado pela hierarquia vigente.

Manifesta-se como crença e ação. Pode ser consciente e não consciente.

Exemplos:

  • considerar pessoas tidas como brancas “mais confiáveis” ou “mais trabalhadoras” que pessoas negras e indígenas;
  • relacionar as religiões de matriz africana ao mal ou ao “demônio”;
  • usar vocabulário que relaciona o negro a algo ruim;
  • presumir que um jovem negro é um bandido em potencial.

Para além de ações individuais, o racismo se manifesta em nossa educação, na cultura, na mídia, nas instituições e nas políticas públicas.

Após considerarmos todos esses conceitos, surge uma reflexão: é possível falar em “racismo reverso”?

Por ser social, político e histórico, o racismo não é igual em todos os lugares, e as hierarquias raciais dependem da história e da construção de cada povo e território. Por exemplo, nos EUA, desde o século XIX se criaram políticas de exclusão, discursos e estereótipos contra a mexicanos e latinos em geral, chineses, japoneses, árabes e, claro, negros. Boa parte dessas populações ainda sofre os impactos desse racismo no país. Já em alguns países africanos, a hierarquia é étnica, fator que causa uma série de impedimentos e conflitos entre grupos diversos que lutam contra essa estrutura – como foi o caso da Guerra do Biafra na Nigéria (1967-1970) ou do Genocídio de Ruanda (1994).

No Brasil, nossas relações raciais se construíram de modo diferente dos exemplos acima – nossa hierarquia racial colocou as pessoas lidas como brancas no topo e os grupos negros, como inferiores. É por isso que sempre que se fala sobre racismo no Brasil, fala-se sobre a população negra.

Racismo estrutural

O racismo não se constitui apenas por ações individuais ou isoladas. É estrutural, ou seja, construído a partir de todo um campo material e simbólico que forma os indivíduos desde a infância, em um processo hierárquico que precariza a existência e o desenvolvimento das pessoas que estão na base dessa estrutura.

Saiba mais

Para saber mais sobre racismo estrutural, clique aqui e assista à entrevista da historiadora Lilia Schwarcz com o advogado e pesquisador Silvio Almeida.